maio 02, 2006

Internetês


A Língua Portuguesa mudou através dos séculos. E continua mudando. A forma de tratamento “Vossa Mercê” sofreu mudanças lingüísticas até a forma “você”, que continuou mudando até a pronúncia “cê vai?” e a actual escrita dos usuários da internet: “vc”.

Uso de abreviação na fala e na escrita não é novidade. Neologismo também não. A todo momento surgem grupos que criam seu próprio vocabulário, com palavras que às vezes se tornam gírias, como muitas expressões faladas pelos surfistas e outras “ galeras ”, “ tá ligado ?”. Alguns diálogos são até inacessíveis a pessoas que não fazem parte de alguma “tribo”.

Os usuários da internet utilizam uma linguagem própria nas salas de bate-papo. Encurtaram palavras, retiraram acentos, pontuações e criaram mais um fenômeno de variação lingüística, o internetês, uma espécie de dialecto do mundo digital com palavras e abreviaturas que são verdadeiros códigos entre internautas.

Em um canal de TV por assinatura há uma sessão chamada “Cyber Movie”, que exibe semanalmente filmes com legendas em internetês. Em alguns segundos é possível ler palavras como naum (não), kra (cara), fazendu (fazendo), estaum (estão) e D+ (demais), o que pode deixar confusa uma pessoa que não faça parte do contexto das conversas instantâneas.

É possível aprender estenografia, um tipo de escrita simplificada que aproveita melhor o tempo e o espaço, assim como o objetivo do internetês. Será que no futuro próximo haverá curso de internetês para ver os filmes ou entender o que os alunos escrevem? Aceito o dinamismo da língua, mas torço para que os cinemas não tenham a mesma idéia da TV por assinatura.

Acatar todas as grafias e falas “alternativas” e propagá-las na mídia é um exagero. Em Lingüística, aprendemos noções de variedade lingüística. E também de adequação. É preconceito lingüístico classificar os socioletos em certo e errado, de acordo com a norma padrão da língua, mas devemos ficar atentos com a adequação no uso da língua.

Vale mostrar nas escolas que a civilização não vai acabar com a expansão do internetês, mas o aluno tem que entender que a variação linguística permite escolhas adequadas e que essa linguagem é legítima, mas limitada a um tipo de interlocutor.

O internetês é uma espécie de variação da língua entre pessoas que utilizam a internet e sua característica é a agilidade e facilidade de escrita. O desafio é mostrar ao aluno que ele não pode produzir textos o tempo todo como se estivesse nas salas de bate-papo, ou seja, deve aprender a utilizar de forma adequada os diversos registros de linguagem, inclusive a norma culta.

Por Solange Firmino